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sábado, 16 de julho de 2011

Espiritismo, Sincretismo e Cultos Afro-Brasileiros

Na obra Africanismo e Espiritismo – Cap. I, Deolindo Amorim afirma:

"Tem-se procurado, aliás sem razão plausível, confundir o Espiritismo com velhas práticas afro-católicas, enraizadas no Brasil desde o período colonial. Argumenta-se, em defesa de tal suposição, que nas práticas africanas se verificam manifestações de espíritos, o que, no entender de muitas pessoas, é suficiente para dar cunho espírita a essas práticas. O raciocínio é mais ou menos este: onde há manifestações de espíritos, há Espiritismo; logo, as práticas fetichistas são também práticas espíritas, porque nelas se faz evocações de espíritos".

"Eis aí uma preliminar discutível. Em primeiro lugar, o que caracteriza o ato espírita não é exclusivamente o fenômeno; em segundo lugar, o Espiritismo (corpo de doutrina organizado por Allan Kardec) surgiu no mundo em 1857, e quando suas obras chegaram ao Brasil, já existia o Africanismo generalizado, principalmente na Bahia."
"Historicamente, como se vê, não é possível estabelecer qualquer termo de comparação, porquanto o Africanismo data da época muito recuada, ao passo que a Doutrina Espírita é do século passado..."(século XIX)

"O Africanismo tem ritual organizado, de acordo com suas tradições seculares, fundadas na crença em divindades peculiares a seu culto, enquanto o Espiritismo não adota ritual de espécie alguma, não tem forma de culto, nem adora divindades. É uma doutrina de base científica, propensa ao método experimental, de cogitações filosóficas muito elevadas, porque trata do destino da alma humana, preparando o homem para a prática do Bem, única estrada que conduz a Deus."

"Muito deve o Brasil ao braço africano, cujo suor, com sacrifício e dedicação, regou os alicerces da prosperidade econômica do país. O africano trouxe para o Brasil os elementos de sua cultura, já muito velha àquele tempo. Deu-se logo a mesclagem cultural, mais esclarecida, atualmente, pelas investigações da Sociologia. Com o tempo, porém, o culto africano começou a desfigurar-se, perdendo as suas linhas originais, em conseqüência d gradativa e inevitável influência do Catolicismo. Fundiram-se, pois, três tipos diferentes na formação do Brasil: europeu, africano e aborígene. Entre os filhos da terra, os aborígenes, não havia uniformidade de usos e costumes, o que não deixa de refletir a forma de culto..."

"O Africanismo perdeu há longo tempo, no Brasil, seus traços primitivos. Formou-se no país uma cultura de fusão, disto resultando o sincretismo religioso: um pouco de Catolicismo, um pouco de Africanismo e um pouco de Espiritismo deturpado pelo misticismo popular."

No Cap. II, o autor, informa:

"Não se discute que o objetivo do culto afro-católico, com todos os seus elementos religiosos e culturais, seja ou não o Bem; mas o que se acentua é que Espiritismo não se identifica nem se confunde com o Africanismo. A prática deste último obedece a prescrições ritualísticas, enquanto a prática espírita dispensa e rejeita qualquer fórmula sacramental, qualquer objeto de culto etc..."

"O Espiritismo encontrou, no Brasil, a preponderância do Africanismo e do Catolicismo, com um fator absolutamente favorável: o baixo nível intelectual das massas, educadas na superstição e sob o influxo da Religião Católica, que lhe imprimiu o apego aos ídolos, aos símbolos etc... Difícil tem sido ao Espiritismo reagir contra a propensão de grande parte de seus simpatizantes para o culto fetichista. Daí muita gente, que desconhece o assunto, que não sabe o que é Espiritismo, dizer que Espiritismo e Africanismo são sinônimos... Eis um erro que precisa ser desfeito. Umbandismo, ou qualquer outra forma de Africanismo não constitui modalidade do Espiritismo.

No Livro O Espiritismo e as Doutrinas Espiritualistas no Cap. III Deolindo Amorim acrescenta:

"Apesar do aspecto comum – o caráter espiritualista – a Umbanda não se configura no corpo da Doutrina Espírita nem o Espiritismo se conforma à organização religiosa da Umbanda. À parte o fenômeno, que é ponto pacífico, devemos considerar os dois movimentos em seus campos adequados, sem confusão nem rivalidade: Umbanda deve ser compreendida como Umbanda e Espiritismo deve ser compreendido como Espiritismo".

A propósito, cabe esclarecer que não existe espiritismo de mesa, alto espiritismo, baixo espiritismo, espiritismo de mesa branca, e outras expressões similares. Existe somente Espiritismo.

Aliás, ficam também esclarecido que a expressão Kardecismo não corresponde à realidade, pois a doutrina não é de Kardec. Allan Kardec organizou, codificou a Doutrina Espírita ou Espiritismo, que lhe foi passada pelos Espíritos encarregados de concretizar entre nós o Consolador prometido por Jesus.

Transcrevemos abaixo pergunta de um céptico e a resposta de Allan Kardec, constante da obra O que é o Espiritismo, que bem esclarece o assunto:

"V. – O senhor tinha razão de dizer que das mesas giratórias e falantes saiu uma doutrina filosófica, e longe estava eu de suspeitar as conseqüências que surgiram de um fato encarado como simples objeto de curiosidade. Agora vejo quanto é vasto o campo aberto pelo vosso sistema.

A.K. – Nisso vos contesto, caro senhor; dais-me subida honra atribuindo-me esse sistema quando ele não me pertence. Ele foi totalmente deduzido do ensino dos Espíritos. Eu vi, observei, coordenei e procuro fazer compreender aos outros aquilo que compreendo; esta é a parte que me cabe.

Há entre o Espiritismo e outros sistemas filosóficos esta diferença capital; que estes são todos obra de homens, mais ou menos esclarecidos, ao passo que, naquele que me atribuís, eu não tenho o mérito da invenção de um só princípio.

Dize-se: a filosofia de Platão, de Descartes, de Leibnitz,; nunca se poderia dizer: a doutrina de Allan Kardec; e isto, felizmente, pois que valor pode ter um nome em assunto de tamanha gravidade?

O Espiritismo tem auxiliares de maior preponderância, ao lado dos quais somos simples átomos."

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